segunda-feira, 28 de abril de 2014

Recompensa



Você encara o parto, vendo aquele sangue jorrando, sua amada toda aberta. Sempre sorrindo pra que ela não perceba seu desespero. Sai um, sai outro, é sucção no nariz, é pano na cara, é teste de apgar, tira medida, vai pra lá, vai pra cá e você do lado, garantindo que tudo seja feito da maneira correta.

No primeiro cocozinho você está lá, limpando aquele mecônio que parece sabão em pasta com um sorriso largo, achando tudo engraçado.

E aí quando você termina, depois de gastar 73 bolas de algodão, percebe que o rolinho ao lado deu aquela caprichada também. Você segue firme e parte para nova empreitada.

Você fica olhando praquele umbigo pendurado pensando “que bagulho estranho!” mas encara e mergulha o cotonete no álcool 70 pra limpar, e limpar e limpar até ele cair, necrosado e duro.

Você fica zumbizando durante meses, sem dormir pra que eles durmam. Acorda toda hora e olha pra ver se tá respirando, se não virou, se não golfou, se não engasgou, se não fez cocô, se não fez xixi, se tá quentinho, se tá com frio.

Você encara o primeiro banho como se fosse algo normal, como se não estivesse se borrando de medo em jogar água naquele bebê todo molenguinho, com a cabeça incerta precisando de apoio. A água deve estar na temperatura certa, cuidado com o olho, com o ouvido, com o umbigo balangando. Cuidado na hora de virar, vai escorregar! Limpa a dobrinha, molha a cabeça, você está suando, em bicas, mas ele tá limpinho. E quando você respira, olha pro lado e o segundo pacote já está sendo entregue. Recomeça.

Emergência na madrugada. Acorda, vomita, 3 da manhã. Você levanta, limpa aquilo e tenta voltar a dormir. Outro choro, nova golfada. Você levanta e limpa novamente e já sabe que perdeu, nem deita mais. Tá bom, xingo meio mundo, duvido da existência de Deus e blasfemo contra minha mulher. Mas o chão fica limpinho.

É cavalinho, é cangote, é luta é boneca. Atividades, reciclagens e tudo mais o que você acha importante para que desenvolvam sua criatividade. 

E não pense em aparecer com genéricos. Toddynho é toddynho, biscoito da vaquinha só com chocolate maltado e batata só Ruffles. 

De noite você conta historinhas intermináveis, levando em conta os comentários e adendos de cada um a cada página. Você vai dormindo e percebe que está falando aramaico e que o João do pé de feijão está se separando da Cinderela porque descobriu que a Ariel tinha um caso com a fera. 

Você faz os melhores planos, imagina o futuro e tenta garantir que seus sonhos se realizem. Oferece o que de melhor você tem, ainda que por vezes deixe escapar algo pior. Dá carinho, amor, diz não, enfrenta birra, separa briga, pede silêncio. Procura ser uma referência que ajude a melhorar esse mundo cão.

Aí chega mais uma noite, mais uma hora de dormir.

Você se prepara, arruma a cama e o espírito. Eles entram no quarto.

Sobem na cama, cada um na sua.

E oferecem a recompensa por tudo que você fez por eles:

RÁ RÁ RÁ RÁ RÁ

NO LEPO LEPOOOOOOOOOOO

RÁ RÁ RÁ RÁ RÁ

NO LEPO LEPOOOOOOOOOOO

Ao quadrado....

Onde foi que eu errei?????

domingo, 20 de abril de 2014

Procurando pelo em ovo (de Páscoa)

Nada a ver com o texto, mas é muito boa rsrsrsr
Meus amigos, distintas senhoras, é chegada a hora do coelhinho e de seus detratores: os chocochatos. Eles são malvados, eles encheram seu bucho juvenil de chocolate, de todas as formas, de todas as cores, elas fazendo birra pelo do que vinha com fotos do Menudo dentro, eles querendo o do He-Man (vai vendo como estamos véios rsrs), se lambuzaram e mergulharam no cacau seguindo as patinhas pela casa. Mas aí cresceram, e passaram a tergiversar sobre o coitado, a dizer que o bichano é agente infiltrado do cramulhão capitalista pra seduzir e formatar crianças pro consumo. Isso sem falar nos textos apócrifos do face.

Tudo bem que tem ovos caros, que inclusive podem ser trocados na própria loja pelo seu carro ou um rim, mas convenhamos, com uma merrequinha dá pra fazer a alegria da garotada. Ou até mesmo sem nenhuma, basta imaginação e amor, o resto é resto, mas esse não é o ponto. Só não me amanheça vestido de coelhinho trazendo cenouras na cesta, aí é sacanagem com a molecada.

Eu tenho amigos que passam a semana da véspera percorrendo os supermercados e lojas americanas só quebrando o máximo de ovos que puderem para, no dia seguinte, amanhecerem na porta desses estabelecimentos com o intuito de arrematar os ovos, quer dizer, os restos de Páscoa. Aí compram tudo baratinho, com os olhos esbugalhados, babando e pensando "eu enganei o capitalismo! Otários!". Só não pararam pra pensar que um ovo quebrado não vale nada e que era muito melhor comprar um outro chocolate que, com certeza, será mais barato. Pode ser um daqueles que eles comem durante todo o ano mesmo, não tem problema rsrs.

E como Páscoa é e sempre será Páscoa, assim como seus detratores e esmagadores profissionais de gostosuras ovais, resolvi postar aqui novamente uma carta que recebi tempos atrás. Remexendo em meus alfarrábios encontrei-a perdida no meio das traças e percebi que a cada ano ela se torna mais atual, daí sua republicação

Questão de direito ao contraditório. Ele merece. 

Prezado Cappelli,

De minha toca, degustando uma cenoura, acompanho o que vem sendo dito sobre mim pelo meu tablet. Já até mandei um imeioul alertando o Papai Noel, dizendo pra ele tomar cuidado, que os tempos mudaram e que ele avise paras as renas que, se os pedidos diminuírem, poderá acontecer um corte de pessoal. Sugeri também que, pelo andar do trenó, é melhor que ele emagreça. Não ficarei espantado se dentro em breve surgir uma campanha contra seus quilos a mais, o que poderia ser um péssimo exemplo para crianças com cada vez mais problemas de obesidade. #fica a dica.

No meu caso, é com grande espanto que assisto ao pulular de opiniões, o que me faz mexer o bigode dez vezes mais que o de costume, parece até um tique. Uma corrente me acusa de estar doidão e achar que coloco ovos de ouro com preços acima do mercado. Ora, meu amigo, todos sabem que o produtor é o que menos lucra no mundo dos negócios. Digo e repito: eu boto o ovo. O Homem bota na prateleira.

E se acharem melhor eu posso também colocar um ovo em barra, tranqüilo. Assim resolvo o problema dos que acham que não devem pagar mais pelo formato. Se existe carne de soja, que não é carne, não vejo nada demais. “Olha a barra de Páscoa!” Por mim, tudo bem. É só anunciar que são ovos de Páscoa prensados e estamos resolvidos. Como vocês humanos vão explicar isso pros seus filhos aí já não é comigo. Vão mostrar um retângulo e o menino vai falar: ovo! Daí pra terapia é um pulo.

Aos mais inflamados, que acham que eu transformei uma data sagrada em festival profano, que utilizo meus ovos para incitar criancinhas indefesas ao consumismo desenfreado, sugiro comprar ovos, ovais ou em barras, mais em conta. Ou então esperem passar a data para se deleitar na promoção dos ovos em cacos, um outro formato possível. Digo e repito: eu boto o ovo. O Homem bota o preço.

Aos que acham que o chocolate só engorda e que as crianças não devem comê-lo neste dia, somente nos outros 364, tudo bem, eu entendo. Sugiro ovos mais nutritivos, ovos verdes sabor brócolis ou ovos orgânicos de pepino e agrião. Digo e repito: eu coloco o ovo. O Homem coloca a caloria.

No futuro já imagino as crianças ganhando ovos de isopor, reciclado, é claro, que ao serem abertos trarão a surpresa: barrinhas de cereais. Pronto: vai ficar barato, não vai engordar e os pais poderão desfrutar do imenso amor que os filhos darão após serem agraciados com este ovo de grego. Digo e repito: eu coloco o ovo. O Homem coloca a neura.

Perdão pelo desabafo prolongado, amigo, mas meu pelo já tava até caindo de estresse. É difícil levar a culpa dos males do mundo sozinho.

Abraço,

Ricochete.




segunda-feira, 14 de abril de 2014

A alma do negócio




Na semana passada tivemos um prenúncio de incêndio no fantástico mundo de Bob. Maurício de Sousa teria defendido, na sua página do instagram, a publicidade voltada para o público infantil. Não vou entrar no mérito acerca da sua intenção ou não pois o que me importa é a publicidade em si, o que ela representa e em que medida se torna eficaz ou não.
Não sei se vocês sabem, mas a televisão foi criada com a intenção de ser um Polishop, de só ter propaganda. Um veículo pra atingir milhões de pessoas dentro de suas casas, um elo perfeito entre o capitalismo selvagem e seu bolso. Ou vocês nunca pararam pra pensar que quem sustenta todas as emissoras são os anunciantes dos intervalos? Mas como não são bobos, sabem que propaganda direto ou demorada iria nos afastar dessa estratégia e então colocaram entre elas programas que nos prendem, nos envolvem, com o único intuito de que permaneçamos sentados na sua frente na hora que vale de verdade: a do plim plim.
E como sabemos, minhas queridas, tem reclame pra todo mundo. Tem aquele voltado para as diferentes classes, para os diferentes vícios, para os diferentes gostos, para as diferentes idades, opções sexuais, desejos etc etc etc. Sempre existirá um profissional pensando no seu perfil consumidor, na sua capacidade de gastar, se endividar, honrar seus compromissos, dar calotes e abrir crediários intermináveis. Os 30 segundos são resultados de meses de pesquisas com grupos focais, com especialistas, sociólogos, psicólogos e afins, todos imbuídos da mesma missão: fazer você comprar.
E não se enganem. A maioria das propagandas infantis são feitas para atingir os pais. “Seu filho não pode deixar de ter isso, olha o que ele está perdendo, todos os amiguinhos deles vão querer (e ter), olha como ela vai ficar linda de princesa e ele de Super- herói”. Ela vê aquela roupinha linda e quer pra filha. Ele vê aquele carrinho maneiro e quer pro filho.
A não ser algum caso extraordinário que vocês me contem, me parece que, por mais eficaz que seja a propaganda, as crianças ainda não possuem cartão de crédito/débito para fazer com que elas completem seu circuito financeiro. E é isso que acho que não está claro para a maioria: nós somos o alvo, os que se rendem ao choro, à culpa, às emoções e nos casos mais extremos, às dívidas. É como aquele safado na praia que te vê com duas crianças e para na sua frente gritando “quem quer picolé, olha o picolé pra criançada, de chocolate...” rsrs
Elas vão querer, mas um minuto atrás não queriam, elas não precisam. Ele quer vender e sabe que a estratégia é fazer com que as crianças te convençam, não ele. Ele não quer que você compre um Chicabon pra você, longe disso. Quer que você se renda ao canto do capital.
São milhares os adultos que gastam e gastam e se enrolam todo com dívidas porque compraram de acordo com a publicidade. Parecem criança? A avó de minha Giullinda tem coisas do polishop guardadas no armário que ela nunca usou. Tem tanto bagulho que quando ela abre digo que é uma porta pra Nárnia rsrsr. Outro dia ela nos deu uma panela enrolada num jornal. Quando tirei e dei uma olhada tava noticiando o Golpe Militar rsrsrsrs.
 E quem não tem algo em casa que pouco usou, quase nunca, que comprou e não se afeiçoou mais tarde? Vamos acabar com o Polishop? Cortaremos as propagandas de refrigerantes? De tabletes? De celulares que também influenciam as crianças? Vamos pedir o fim dos desenhos animados, que depois viram bichinhos e álbuns de figurinha e roupas e tudo quanto é quinquilharia possível? Vamos pedir o fim do futebol, que fazem nossos meninos quererem chuteiras tais e bolas que tais? Vamos acabar com os shows de música que querem vender CDs e estilos? Vamos acabar com a TV????
Muitos de nós reclamam dos comerciais e trocam de celular como quem troca de cueca. De sapatos idem. Roupas que são usadas uma vez, quando muito. Um consumo desenfreado e sem sentido que causa muito mais influência do que qualquer comercial. O “seu pedido é uma ordem” que muitos oferecem gera crianças insaciáveis, já que o que eles querem é o limite, não do seu cartão de crédito, mas do não, do “não tenho dinheiro” e do “você não precisa disso”.
Sophia, lá em casa, quando passa uma propaganda ela sai falando: “tudo caro, é tudo mentira”. Thomaz manda um “eu quero, pai” e eu retruco “eu também, filho, compra, compra pra mim” rsrs. Na Ri happy - desespero total - canso de falar: "puxa filho, não tenho dinheiro pra comprar. Deixa eu trabalhar mais pra juntar um trocadinho e depois conversamos". É claro que não terá um depois porque o estímulo do momento sucumbe à necessidade de fato. E pra isso, em casos extremos, existem os avós rsrsrsrs.
Pode ser a propaganda que for, com o melhor dos marqueteiros mas nada, nada supera uma conversa com uma boa orientação. Sobre consumo, sobre o planeta, sobre a necessidade, sobre o valor, sobre as prioridades, sobre como é difícil ganhar o tutu para comprar aquilo. É claro que vez por outra podemos ceder, mas isso não pode, em minha opinião, ser a regra.
É ilusão achar que o fim da publicidade infantil, mesmo que efetivado, seja a solução para o consumo. As crianças não são marionetes na mão de publicitários malévolos. Entre a TV e qualquer outro tipo de propaganda e informação existe você e sua explicação, assim como quando se passa por um mendigo, que se vê um jornal com as tragédias cotidianas e demais acontecimentos. E desde cedo eles entenderão que, apesar de não ser o mundo ideal, existem escolhas que podem ser feitas para torná-lo mais aprazível. Inclusive a do canal.
Obs: seu filho anda dormindo pouco? Veja isso.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Segue teu rumo



São inúmeras as referências que podemos usar para cuidar e educar nossos filhos. Existem livros, vídeos, especialistas, pesquisas que produzem todo o tipo de informação possível, com um simples objetivo: te desorientar. Sim, minha querida, porque você desorientada fica insegura e quando estamos nesse estado de espírito ficamos mais vulneráveis às opiniões alheias, ou seja, maior consumo de artigos que lhe ofereçam ao menos a sensação de que, se não está fazendo certo – como eles dizem que deve ser – ao menos está tentando dentro do que existe de mais moderno em assuntos psicossociais - infantis.
E nós, em primeira viajem e logo com dois de cara, fomos em busca desses livros, das referências, do como é que se faz para criar a melhor condição possível dentro do lar. Você lê, lê, lê e, depois que tenta colocar em prática, percebe que aquele desgraçado nunca deve ter tido filhos ou pior, se teve, não devem se falar há anos por conta dos traumas juvenis. Aí você se pergunta: Quem lavava a roupa? Quem faxinava a casa? Quem trabalhava? Quem passava roupa? Quem ia ao mercado? Quem???
A teoria é linda, os desenhos bem acabados, as receitas perfeitas e o passo a passo fenomenal. Tentamos de tudo e nada dava certo e aí vem o receio: somos nós que não interpretamos direito ou os autores são estrangeiros que escrevem o roteiro da Supernany? Falhamos na aplicação das regras ou não tivemos tempo pra ler as notas de pé de página? Fracassamos como pais ou aquele monte de informações são inúteis no contexto em que nos encontramos?
Fica claro que existem modelos que podem ser seguidos, um mais rígido, europeu, outro mais confuso, americano – vide as tragédias nos colégios – e o nosso. E quando digo nosso, digo cada casa, cada família, cada filho. Um filho extremamente obediente na infância pode se tornar submisso. Se for malcriado, pode se tornar um fora da lei. Se for isso, pode se tornar aquilo e aquilo outro. Tudo pode, nada é certo e é preciso saber conviver com isso. Você colabora mas em algum momento as decisões serão autônomas e suas opiniões apenas conselhos. O importante é ter convicção, a certeza de que o modelo utilizado foi aquele possível dentro de suas capacidades e situação e que esse sempre será o melhor caminho. É claro que estamos deixando de lado casos sinistros, de maus tratos, abandonos e etc. Estamos falando das pessoas de bem, que na sua loucura diária encontram tempo para pensar sobre isso e oferecer o que de melhor pode ser oferecido.
Esse é o ideal, é esse esforço que será levado em consideração por seus filho no futuro, quando todos estiverem rindo do que fizeram ou deixaram de fazer quando criança. O valor está contido no esforço, na conduta de vida, nos princípios, na vontade de acertar dentro do que você considera o correto. O resto é apenas opinião dos outros...